segunda-feira, 7 de março de 2011

Verde ou Maduro??

Há alguns dias, num daqueles jantares muito bem regados, surgiu a conversa sobre os Vinhos Verdes, onde um amigo, supostamente bem informado, me evidenciou o facto de que afinal de contas existem vinhos verdes maduros…
A partir daí surgiu a vontade de dissipar algumas das dúvidas que possam existir a esse respeito: todos os vinhos são maduros, ou seja, feitos a partir de uvas no seu pleno estado de maturação.
Vinho Verde é o nome de uma região portuguesa, tal como as regiões do Douro, Ribatejo ou Alentejo. A região ganhou o nome de Vinho Verde por ser a região mais verde e húmida de Portugal, o Minho. Pela mesma razão, a região de turismo chama-se Costa Verde. Constitui uma denominação de origem controlada cuja demarcação remonta a 1908, para vinhos jovens no Noroeste de Portugal, entre o Rio Minho e o Rio Douro.
Assim sendo, não faz qualquer sentido a pergunta “Verde ou Maduro?”, mas sim a pergunta:  “Vinho da região do Alentejo ou da região dos Vinhos Verdes?”, ou “ Vinho da Bairrada ou Douro?”, aliás todas elas Regiões Determinadas, DOC (Denominação de Origem Controlada).
Tal como na maioria das outras regiões demarcadas de Portugal, na região do Vinho Verde também se fazem vinhos brancos, rosados, tintos e espumantes, todos eles vinhos maduros, feitos de uvas sãs, em bom estado de maturação, pelo menos tanto como nas outras regiões portuguesas. Vinhos modernos e recomendáveis que nada devem aos restantes vinhos portugueses. É evidente que estes vinhos apresentam um estilo único, diferenciado e típico. Mas não me digam que é pela tipicidade do Vinho Verde que surge este equívoco, porque é sempre de tipicidade que se trata quando se fala em Denominações de Origem (todas elas singulares e únicas no mundo). Existem também vinagres de vinho verde, aguardentes de vinho verde e reconhecidas bagaceiras.


O facto de os vinhos apresentarem um estilo ímpar e inimitável é o melhor cartão-de-visita para a denominação de origem Vinho Verde. Os brancos são por regra leves, frescos, acídulos, pouco alcoólicos, pouco encorpados, florais, particularmente bem adaptados aos calores do Verão. No caso dos Alvarinhos, são vinhos extraordinários em elegância e harmonia. E ao contrário do senso comum, são vinhos que podem envelhecer muito bem, capazes de proporcionar momentos de alegria após alguns anos de guarda. Os tintos são por regra acídulos, taninosos, agressivos e rústicos, difíceis na análise e na prova se desemparelhados da sua gastronomia local. Por último, surgem os espumantes, uma das apostas e esperanças fundamentais da região.
No entanto sobre o nome, Vinho Verde, escreve Luís Lopes:
"…tudo indica que, efectivamente, o nome Vinho Verde, que já vem do século XIX, se deve precisamente ao facto da conjugação do clima e das antigas técnicas de viticultura locais (vinhas exuberantes, conduzidas em altura e profusamente regadas pela água das hortas) condicionarem a maturação das uvas. Ou seja, esses vinhos chamaram-se Verdes porque eram efectivamente feitos de uvas verdes. Tanto que, a legislação vitivinícola portuguesa de 1946 dividia os vinhos nacionais, precisamente, entre "verdes" e "maduros". (...) Hoje, na sua maioria, é uma região de viticultura moderna, com castas de grande qualidade (Alvarinho, Loureiro, Avesso, por exemplo), e uvas que atingem o ponto de maturação ideal." E também hoje, na região do Vinho Verde, as pessoas referem-se aos outros vinhos como "vinho maduro".


Ou seja este equívoco já é de longa data e até tinha o seu fundamento, mas hoje em dia a questão deixou de ter lógica.
Devido às características edafoclimáticas1 encontradas nessa região demarcada, os vinhos lá produzidos, sejam brancos ou tintos, têm uma concentração em ácido málico2 superior à que é frequente nos vinhos de outras regiões de Portugal. Em geral as pessoas não se apercebem, mas quando termina a fermentação alcoólica do mosto, também designada por fermentação tumultuosa3, ainda não terminou a vinificação, pelo menos nestes vinhos.
O vinho verde é o segundo vinho português mais exportado depois do vinho do Porto.
1-      As condições edafoclimáticas são relativas à influência dos solos nos seres vivos, em particular nos organismos do reino vegetal, incluindo o uso da terra pelo homem, a fim de estimular o crescimento das plantas.
2-      O ácido málico é um ácido orgânico encontrado naturalmente em frutas como a maçã, a pêra ou a uva. Consiste numa substância azeda e adstringente, muito empregada como acidulante, aromatizante e estabilizante na indústria alimentícia. Na indústria farmacêutica, o ácido málico é utilizado na higienização e regeneração de ferimentos e queimaduras. O processo de fermentação malolática converte o ácido málico em um ácido lático mais suave.
3-      A fermentação tumultuosa dura poucos dias, quando ocorrem um grande desprendimento do gás carbónico e o aumento da temperatura.
Espero assim ter contribuído para esclarecer uma dúvida tão comum no nosso dia-a-dia e até no universo da restauração.